sexta-feira, 6 de julho de 2012

CRÔNICA DO FILME REPÓRTERES DE GUERRA




Herói ou urubu predador?




“Um homem ajustando suas lentes para tirar o melhor enquadramento do sofrimento dela talvez também seja um predador, outro urubu na cena” (Kevin Carter)


A aula é de jornalismo literário e a ideia é assistirmos ao filme Repórteres de Guerra, baseado no livro The Bang Bang Club, escrito por Marinovich e João Silva. Não sabíamos ao certo do que se tratava (esperava aquelas tradicionais cenas de guerra, muitos sangue e ação). Com espírito voltado para um “cinema” em sala de aula, compramos pipoca e a sessão começou.

À medida que o filme foi desenrolando com linchamentos e torturas brutais travados na África do Sul, e os quatro repórteres fotográficos enfrentando situações de extremo perigo o tempo todo, com o propósito de mostrar a verdade, perdi a vontade até de continuar saboreando a pipoca, simplesmente perdeu o sabor. Algo ficou travado na garganta. Mil pensamentos começaram a “pipocar” na minha cabeça. Só pensava: isso não é ficção, isso realmente aconteceu...

Mas, apesar de toda brutalidade o que mais me chamou a atenção foi a foto tirada por Kevin Carter de um urubu e uma criança desnutrida. No desenrolar do filme o autor da foto ganha o maior prêmio de fotografia do mundo, o Pulitzer. Ao ver os quatro amigos (repórteres) comemorando fiz alguns questionamentos: o que Carter pensou no momento que fotografou? Será que considerou normal ver algo tão desumano? Será que a racionalidade deu lugar ao instinto? Até que ponto o seu sucesso profissional nos exime da responsabilidade de ser humano, de praticar humanidade? Na foto de Carter quem é mais abutre: o urubu ou quem está à espreita para fotografar?

Mas, as imagens que se seguiram, e vi que os protagonistas (repórteres), apesar das comemorações, viviam conflitos intensos. Percebi que cada um deles buscava a melhor foto, em muitas situações expondo a própria vida em busca de retratos do terror ao redor, por conta da exigência cada vez maior por parte dos jornais, revistas e empresas de comunicação. A pressão é muito grande.

Em contraponto, fiquei pensando na repercussão positiva que um foto chocante pode causar, ela pode ajudar milhares de pessoas. No caso da foto de Carter, ela fez o mundo voltar os olhos para a questão do apartheid e da fome da África do Sul.

No final do filme, Carter suicidou-se. Mais uma vez questionei-me se aquela foto havia sido o estopim (afinal, todos questionavam sua atitude diante daquele quadro), mas ao ouvir o que estava escrito no bilhete que ele havia deixado, não tive dúvidas de que não era apenas aquilo, mas sim que sua vida tinha parado de fazer sentido: “Estou deprimido… Sem telefone… Sem dinheiro para o aluguel… Sem dinheiro para ajudar as crianças… Sem dinheiro para as dívidas… Dinheiro!!!… Sou perseguido pela viva lembrança de assassinatos, cadáveres, raiva e dor… Pelas crianças feridas ou famintas… Pelos homens malucos com o dedo no gatilho, muitas vezes policiais, carrascos… Se eu tiver sorte, vou me juntar ao Ken…”

O silêncio na sala de aula era palpável. Acho que cada um estava com seus próprios pensamentos, talvez fazendo as mesmas perguntas. O filme terminou, os questionamentos sobre nós mesmos, certamente não... a única certeza que tenho é que nunca mais serei a mesma depois desse filme.

Um comentário:

  1. Também tive os mesmos questionamentos ao ver o filme. O filme é ótimo e nos faz pensar muito.

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