quinta-feira, 21 de maio de 2009

RESENHA - GLOBALIZAÇÃO - AS CONSEQUÊNCIAS HUMANAS - Zigmunt Bauman

Em sua obra, Globalização – As Consequências Humanas, Zygmunt Bauman dá enfoque às mais diferentes formas de visualização do tema.
Denota-se que, para alguns, globalização é uma meta desejada, e para outros ela é vista de modo desfavorável, porém, independentemente das opiniões formadas, ela é um processo que não pode ser revertido.
O que se busca é dar clareza aos fenômenos visualizados: espaço e tempo, local e global e o autor também desvendar a importância de entender a sensação de apreensão existente no mundo pós-moderno.
Enfim, o que o autor busca é uma tentativa de mostrar que no fenômeno da globalização há mais coisas do que pode o olho apreender e também um exercício de formulação de questões e de estímulo ao questionamento.
TEMPO E CLASSE


Em seu primeiro capítulo, ele faz uma reflexão a respeito de como são construídas as grandes incorporações, indagando sobre a falta de assistência presencial dos investidores, que são os verdadeiros tomadores de decisão (p. 13).
Segue, afirmando que os empregados em nenhum momento têm força de decisão, que as resoluções são tomadas pelos empregadores de capital, geralmente não locais, ao contrário dos funcionários, que têm familiares e moradia local, e que o intuito é buscar lucro com a exploração mão de obra da região.
Essa mão de obra está presa à área e fica à mercê de acionistas que, acaso vislumbrarem perspectivas de maiores lucros em outro domínio, o fazem sem se preocupar nos efeitos desastrosos desse ato.
Existem basicamente duas formas do espaço: aquele onde quem não está aprisionado pela localidade e os que não estão livres da localidade. Os primeiros podem escapar da globalização e dos seus resultados, diferentemente do segundo grupo.
Sob a ótica do pós-guerra, a mobilidade tornou-se fator de cobiça crucial, pois é por meio dela que sobressai a hierarquia social, onde houve uma transmudação dos padrões econômicos, sociais e políticos do local para o mundial, derivando a eficácia do capital e dos investidores.
Porém, com ela veio a desobrigação das empresas com seus empregados, capaz de torná-la desimpedida para se mudar a qualquer tempo, livrando-se, inclusive, das responsabilidades consequentes desse ato, conforme mencionado acima.
Com a nova liberdade do capital e a desvinculação da empresa com o local, não há mais pressão, e quando isso ocorre busca-se, alternativamente, lugares mais pacíficos.
É o fim da distância geográfica, pois ela se tornou apenas um produto social e sua extensão depende apenas da velocidade das informações e dos meios de comunicação.
A respeito do tema, em sua obra A Era do Globalismo, 7ª ed., Ed. Civilização Brasileira, Octavio Ianni argumenta, verbis:

As ciências sociais são desafiadas a pensar o mundo como uma sociedade global e, continua, os estudos e as interpretações podem estar focalizando temas tais como (...) grupos sociais e classes sociais (...) guerra e revolução, modernidade e pós-modernidade. Mas o que tem predominado são as interrogações sobre o modo pelo qual se forma e conforma, organiza e transforma a sociedade nacional, e em que medida o indivíduo é o principal momento da vida social, polarizando muito do que são as relações, os processos e as estruturas.




GUERRAS ESPACIAIS: INFORME DE CARREIRA



No segundo capítulo de sua obra, Bauman afirma que desde a origem da sociedade sempre foram utilizados padrões de comparação de medida, limites e fronteiras, contrariando a ideia de que o espaço social nasce na cabeça dos sociólogos. Partindo dessa premissa, o autor nos expõe à luz de que o ser humano tendenciosamente busca homogeneidade na forma de produzir mapas e a construção de cidades com estruturas similares, utopicamente buscando a “cidade perfeita” e que para a construção e visão da cidade perfeita os homens são obrigados a rejeitar a história e seus traços palpáveis.
Esse mapa, não só geograficamente falando, tinha que ser uniformizado de acordo com as necessidades do Estado Pré-moderno, que, para se tornar moderno, teria que ser oficialmente aprovado por esse mesmo Estado.
E com todo esse processo de transformação operou-se uma desintegração aos “laços humanos”, onde, com a padronização, as relações sociais se tornaram autônomas e, arremata Bauman que “os homens não se tornam bons simplesmente seguindo as boas ordens ou o bom plano de outros”.
A cidade, originalmente criada para preservar a todos dos males vindos de fora, agora se tornou protetora dos inimigos interiores, basta que se observe cada vez mais a busca pela própria segurança como a utilização de carros fechados, sistemas de segurança, etc. Estamos nos isolando cada vez mais, pois o evitamento e a separação fazem parte das estratégias de sobrevivência nas grandes cidades.



DEPOIS DA NAÇÃO-ESTADO, O QUÊ?


Segundo palavras de G. H. Von Wright (apud, Bauman, 1.999, p. 64), a Nação-Estado “parece que se está desgastando ou talvez ‘definhando’, ou seja, existe uma grande possibilidade de eliminação do Estado-Nação, o que pode levar a uma desordem mundial”.
Essa desordem mundial nada mais é do que uma sequência de atos, que se inicia com a falta de definição dos rumos e da falta de quem a controla.
Devido a esse processo, Bauman diz que “o significado mais profundo transmitido pela idéia da globalização é o do caráter indeterminado, indisciplinado e de autopropulsão dos assuntos mundiais; a ausência de um centro de um painel de controle, de uma comissão diretora, de um gabinete administrativo” (p. 67), portanto, a globalização não é nada mais que um processo de desordem da economia e das relações sociais e que leva a percursos inesperados, pois, não se planejam os caminhos, simplesmente eles acontecem.
Consequentemente, nos deparamos com a morte da soberania do Estado, que tem de abrir mão do seu controle para privilegiar a nova ordem mundial. Não se supõe em tempos atuais, um Estado que vise uma política fechada que não se vislumbre o mercado global. O poder econômico foi extremamente abalado e não existem maneiras de se governar a partir de ideologias políticas e interesses soberanos da nação.
A globalização impõe seus preceitos de forma totalitária e indissolúvel, impondo pressões que o Estado não é capaz de fazer desaparecer, ou seja, alguns minutos bastam para que as empresas e a Nação entrem em colapso. O Estado está despido de seu poder e de sua autoridade, somente lhe remanesceram ferramentas básicas para a manutenção do interesse das grandes organizações empresariais. Cabe destacar que toda essa desorganização tem como ponto mais alto as regras de livre mercado, políticas especulatórias, capital global e um Estado pequeno e fraco, que tem como única função a manutenção e criação de processos que mantenham a estabilidade financeira e econômica.
Hoje as mega-empresas têm toda liberdade para realizar manobras econômicas que tornam o Estado um mero espectador, dominado e sem poder de reação.
O livre comércio e o desenvolvimento econômico vêm com a proposta da possibilidade de diminuição das desigualdades sociais, mas isso tem se mostrado uma ilusão, pois o que se apresenta é um aumento cada vez mais elevado da riqueza dos mais ricos e uma diminuição drástica das condições de vida dos mais pobres.
John Kavanagh, do Instituto de Pesquisa Política de Washington, em sábias palavras esclarece:

A globalização deu mais oportunidades aos extremamente ricos de ganhar dinheiro mais rápido. Esses indivíduos utilizam a mais recente tecnologia para movimentar largas somas de dinheiro mundo afora com extrema rapidez e especular com eficiência cada vez maior.
Infelizmente, a tecnologia não causa impactos nas vidas dos pobres do mundo. De fato, a globalização é um paradoxo: é muito benéfica para muito poucos, mas deixa de fora ou marginaliza dois terços da população mundial. (apud, BAUMAN, 1999, p. 79).

Bauman fala dos meios de comunicação mundiais, de como a maior parte dos pobres não têm acesso a eles e, também, que estes meios, ao mesmo tempo, divulgam a existência, num mesmo local, de homéricos crescimentos econômicos e o aumento da camada pobre.
Em seguida o autor coloca que o que se propaga é a ideia de que pobreza é sinônimo de fome, mas existem outras questões da pobreza que ficam “encobertas”: péssimas condições de vida, analfabetismo, famílias destruídas, etc.
Todas as tentativas de mudança encontram barreiras e sua eficiência é momentânea, pois, este sofrimento da sociedade humana tem como precedente, amarras, que são facilmente retraçadas e mutáveis pela globalização e pelo sistema de produção capitalista.


TURISTAS E VAGABUNDOS


No capítulo 4, Bauman discursa sobre o movimento e a noção de que hoje em dia sempre nos deslocamos, mesmo quando estamos fisicamente parados.
O prof. Ricardo Petrella assim resumiu: “A globalização arrasta as economias para a produção do efêmero, do volátil (por meio da redução em massa e universal da durabilidade dos produtos e serviços) e do precário (empregos temporários, flexíveis, de meio expediente).” (apud, Bauman, 1.999, p. 86).
Observa-se, ainda, que numa mesma sociedade de consumo o consumidor é a pessoa em movimento e fadada a se mover sempre.
Movemo-nos divididos, quer dizer que estamos vivendo num mar aberto, sem sinalização que indique o caminho. Podemos nos alegrar com as perspectivas de novas descobertas ou morremos de medo. Ainda poderíamos ter uma terceira opção, um porto seguro, mas na verdade ele não existe, porque quando achamos que o encontramos alguém vem e moderniza, então, ele deixa de ser um porto seguro.
“Todo o mundo pode ser lançado na moda do consumo; todo o mundo pode desejar ser um consumidor e aproveitar as oportunidades que esse modo de vida oferece. Mas nem todo o mundo pode ser um consumidor”, palavras de Bauman, que exemplifica essa colocação com dois extremos: o Turista e o Vagabundo.
O Turista é um privilegiado que conseguiu o prêmio da mobilidade, sua única frustração é pensar que pelo fato de estar aqui agora, não pode estar em outro lugar. Ele vive ansioso pela nova experiência. Seu maior privilégio é movimentar-se porque quer, como quer e quando quer.
O Vagabundo é um consumidor frustrado. Movimenta-se porque é empurrado pela necessidade de experiência. Os seus sonhos são apenas um emprego qualquer, uma tarefa humilhante para o Turista.
O primeiro viaja à vontade, normalmente em primeira classe, diverte-se bastante, é adulado, recebido com sorrisos e de braços abertos. O segundo viaja às escondidas, por vezes ilegalmente, ou pagando pela terceira classe e, muitas vezes, visto com desaprovação.
Metaforicamente, Bauman designa os turistas como as pessoas de extrema mobilidade e os vagabundos 80% dos cidadãos e que a pós-modernidade vai trazer cada vez mais a exclusão social, que gera uma subclasse.


LEI GLOBAL, ORDENS LOCAIS



No último capítulo, o autor lembra o que Pierre Bourdieu escreveu no artigo apresentado numa conferência em Freiburg, Alemanha, em outubro de 1996, onde cita uma declaração feita por Hans Tietmeyer, presidente do banco central alemão, quando, de forma casual e descuidada, afirma que o que está em jogo hoje em dia é criar condições de confiança para os investidores.
Tietmeyer explica que essas condições seriam o controle de gastos públicos, redução de impostos, reforma do sistema social e o desmantelamento das normas do mercado de trabalho, pois este é rígido demais e precisa se tornar flexível, ou seja, mais dócil e maleável.
Acrescento aqui, que para Tietmeyer só isso é importante e o resto “que se lixe”... como se pode ver o “resto”, no ano passado, foi o início da crise financeira americana que abalou a economia mundial.
Quanto à questão sobre lei global e ordem local, o autor transmite a ideia que todos os processos mundiais têm as mesmas características, pois todos aplicam leis que garantem à classe média as condições mínimas e castiga com leis severas as classes desfavorecidas.
Faço um pequeno aparte para citar um trecho, que fala sobre globalização, na obra de Renato Ortiz, Um Outro Território – Ensaios Sobre a Mundialização, 2ª edição, Ed. Olho D’água, agosto 2003, p. 193-194:

Em uma situação história na qual as relações sociais estão definidas. Para apreendê-las, é necessário repensar aspectos das Ciências Sociais. Não se trata a rigor de uma mudança paradigmática, mas o estoque de conceitos que possuímos, devido à historicidade do objeto, foi cunhado para dar inteligibilidade a um outro contexto. No caso da Sociologia, Ciência Política e História, a referência ao Estado-Nação tem sido preponderante. Conceitos como identidade nacional, partidos, história nacional e modernização são aplicáveis quando se postula a nação como integradora dos processos sociais.

Para finalizar, o livro de Bauman traz consigo a reflexão das consequências da globalização para os seres humanos, onde a cada momento temos um aumento da pobreza e diminuição das condições mínimas de sobrevivência. Em contrapartida, existe um aumento das grandes potências empresariais e da exploração advinda do seu modelo desvinculado do local, tendo na sua visão e modelo global, um alicerce para sua manutenção e precariedade da vida humana.
CONCLUSÃO

Qual será o futuro do ser humano com a globalização? É preciso parar e refletir, pois estamos cada vez mais envolvidos por um turbilhão de informações e mudanças, e afinal, afinal, como sabiamente afirmou o autor, estamos num barco à deriva, sem destino e sem comando.

4 comentários:

  1. Obrigada!!!!!!!! Muito bom o artigo, esclareceu muitas duvidas. Boa Sorte.

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  2. outro anônimo diz...
    muito bom mesmo.

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  3. Muito Bom seu texto, com um resumo não tão "vago" e ou superficial, demostrando certeza do assunto mencionado, Me ajudou bastante no entendimento deste livro de Bauman.. Obs ( Só queria mais um enfoque na Guerras Espacias.. mais está valendo) Parabéns!

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  4. Muito bom o seu texto, facilitou a leitura e compreenção do livro.

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